O agro não somente recompõe a vegetação, mas também preserva a que está de pé

O agro não somente recompõe a vegetação, mas também preserva a que está de pé

16/05/2022 09:28

A liderança não é uma conquista, muito menos algo que vem de um minucioso planejamento estratégico. Os verdadeiros líderes, têm muitos que acham que são por ocupar alguma posição social ou no mundo corporativo, vão madurando através da admiração dos outros perante seu trabalho, pelo que produzem, contribuem para o desenvolvimento de todos, sua integridade, entre outras virtudes.

Além disso, nesse processo há muitos fatores que podem atrapalhar e até mesmo acabar com a caminhada, assim como uma praga, erva daninha, fungo e a seca podem roubar a produtividade de uma lavoura cultivada com todos os cuidados do mundo, é a vida.

Por isso que a característica principal genética de um líder é sua força.

A trajetória que fez do agronegócio ser a atividade líder não só da economia brasileira, mas no fornecimento de alimentos e, em breve de tecnologia para a produção de bioenergia para o mundo, é um exemplo exato da explicação acima.

Nenhum imigrante italiano começou a plantar cana no interior do estado de São Paulo depois da crise de 29 pensando em produzir o combustível líquido mais limpo utilizado comercialmente pela humanidade.

Tão pouco o gaúcho migrou de sua amada terra para desbravar o Centro-Oeste levando sua família para começar tudo em barracas com a certeza que fariam dali o mais eficiente cinturão graneleiro do planeta terra.

E assim se acumulam as histórias, cada uma numa atividade e região diferentes, mas todas com enredo muito parecido, onde o roteiro foi de muito trabalho, briga, pequenos passos à frente em cada safra boa e um enorme tombo nas temporadas ruins.

Isso sem falar no preconceito e pedras que sempre foram atiradas, porém ao invés de se deprimir, o produtor foi criando uma casca resiliente que lhe protegeu para conseguir cumprir com sua função, de produzir, e isso movimentar esse país que nunca deixará de ser da alegria do carnaval ou do futebol, mas também de uma felicidade ainda maior, de conseguir garantir o alimento para boa parte da população mundial.

A entrevista a seguir, com quatro profissionais referências em suas áreas de conhecimento, vem para revelar o tamanho da força do agronegócio num dos assuntos em que ele é mais criticado, a recomposição e preservação das florestas nativas.

O gigante se alimenta das pedras que são jogadas contra ele …

Revista Canavieiros: Qual o tamanho e onde está localizado o “estoque” da Ambientale?

Dirley Schmidlin: Na região da Serra do Mar, principal- mente nas bacias do Atlântico e Alto Paranapanema, próximo da divisa dos estados de São Paulo e Paraná, formado pelas florestas ombrófilas densas (mata atlântica) temos 20 mil hectares do lado paulista e 18 mil em território paranaense. De cerrado trabalhamos com cerca de três mil hectares dentro do Estado de São Paulo.

Revista Canavieiros: Por que quase a totalidade da área é formada por mata atlântica?

Schmidlin: O predomínio de mata atlântica se deve a maior segurança quanto a sua preservação, isso porque nossas áreas estão localizadas em regiões de difícil acesso, de grandes extensões e muito próximas ou até dentro de unidades de conservação, que possuem um sistema integral de proteção.

Revista Canavieiros: Qual a importância ambiental em se preservar grandes áreas?

Schmidlin: A região sul da Serra do Mar paulista é onde estão localizadas as maiores e mais conservadas áreas do bioma Mata Atlântica. Nessa região, é importante mantermos a preservação porque lá a natureza se desenvolve em sua plenitude, tanto a fauna como a flora. Por exemplo, essa estrutura permite diversas espécies de mamíferos possam estar morando lá.

Revista Canavieiros: E por que pouco trabalho no cerrado?

Schmidlin: No cerrado a responsabilidade da manutenção, pela vegetação ser mais suscetível a incêndios e invasões é muito maior, o que eleva o risco do negócio no caso de aquisição. Dessa forma temos áreas somente no formato de sociedade ambiental.

Revista Canavieiros: Explique os formatos de negócios que vocês atuam?

Alexandre Mantoani: São duas modalidades, a primeira é quando a Ambientale adquire, regulariza e transfere para o seu nome uma extensão de floresta. A segunda são as sociedades, onde o dono disponibiliza sua propriedade e nós entramos com todos os recursos necessários de adaptação, tecnológicos e comerciais, para disponibilizá-la aos clientes, nesse modelo é criado um CNPJ e o proprietário fica responsável pela manutenção da mata.

Revista Canavieiros: Quais as vantagens para o dono da área assumir a responsabilidade perpétua de preservação de grande parte de sua propriedade?

Schmidlin: Ao aderir ao programa o proprietário já gera mais uma fonte de renda que será acrescida ao que ele tem com as atividades de agricultura de pequena escala e extrativismo sustentável, além disso nós sabemos do potencial para a geração de novos negócios relacionados à conservação da natureza e estamos viabilizando acesso a mercado de carbono, pagamentos de serviços ambientais e até mesmo a implementação de estrutura para recebimento de ecoturistas. Nosso foco é dar cada vez melhores condições para que ele permaneça na sua propriedade e se dedique à conservação da área.

Revista Canavieiros: Então é certo afirmar que fazer a compensação de reserva legal em áreas de sociedade, além do aspecto ambiental é também contribuir para o desenvolvimento econômico, social e preservação cultural da região que está inserida a floresta?

Schmidlin: Sim, acredito que esse modelo se enquadra em diversos pontos no que diz a teoria ESG, pois todos sabem que uma região de floresta densa, como é aquela região do Vale do Ribeira, a atividade agropecuária (palmito e banana) e extrativista (pesca e produção de mel) é de baixo valor agregado e a renda é para praticamente a subsistências das famílias. Assim, levar novas formas de renda agregadas à preservação é a forma do pessoal nativo ter motivos para permanecer na região, ao contrário do que acontece hoje, onde os pequenos municípios estão num processo de diminuição de suas populações.

Revista Canavieiros: Do banco da Ambientale, quanto está nesse modelo de sociedade?

Mantoani: Temos hoje 60% em área própria e 40% em parceria. Hoje nosso planejamento de crescimento visa mantermos um percentual parecido. Ressaltamos que temos disponíveis cerca de oito mil hectares dentre os 20 mil da região costeira.

Revista Canavieiros: Considerando os variados perfis de produtores de cana, existe um encaixe relacionado às modalidades de compensação de reserva?

Fábio Soldera: A opção é sempre do produtor. Nossa função como Canaoeste é mostrar todas as possibilidades que a lei permite. Nos casos que opta pela compensação, aí vai escolher pelo arrendamento, (através de um pagamento anual), compra do imóvel (transferência de matrícula) ou pela compra da titularidade da floresta (servidão perpétua). Lembrando que no modelo de compra de título que a Ambientale oferece, o direito de exploração, como, por exemplo, a venda de crédito de carbono, fica com a empresa parceira.

Revista Canavieiros: Qual a vantagem em se contratar uma compensação sob o ponto de vista legal?

Diego Rossaneis: Do ponto de vista legal, a vantagem da compensação, compra ou arrendamento, primeiro é o cumprimento de uma exigência da lei, seja ela por sentença judicial transitada em julgado ou para cumprir os prazos do novo código florestal para regularização ambiental (que ainda não se esgotaram, estão em andamento). Regularizando a reserva legal via compensação, o produtor que possui déficit não vai precisar abrir mão de área produtiva, o que irá lhe gerar economia, pois o preço de um alqueire produtivo é mais elevado que de um alqueire de vegetação nativa. É válido deixar claro que, atualmente, como os prazos do novo código florestal ainda estão em andamento, esse tipo de serviço, compensação, é indicado para aqueles produtores que possuem obrigações judiciais a serem cumpridas, sejam por TACs (acordos firmados com o MP) ou em decisões judiciais transitadas em julgado.

Revista Canavieiros: Sobre a visita da área, qual foi sua percepção?

Soldera: A visita aconteceu em áreas do distrito de Ariri, que faz parte do município de Cananéia, fica do lado pau- lista na faixa litorânea da divisa de São Paulo com o Paraná e também no município de Iporanga. Lá podemos verificar de perto as dúvidas sobre sobreposições de áreas e também algumas marcações de divisas. Outro ponto importante foi a checagem do estágio sucessional da vegetação, o qual confirmamos estar já avançado, o que é fundamental para estabelecermos os vínculos de compensação das Reservas Legais.

Revista Canavieiros: Diego, o que foi visto traduz o que diz a legislação?

Rossaneis: O código florestal possui alguns requisitos para se autorizar uma compensação de reserva legal, dentre eles o mais importante é que a área onde ela será compensada deve estar coberta por vegetação nativa preservada ou em processo de recuperação/regeneração. Visitando as áreas in loco pude observar que atendem aos pré-requisitos contidos no novo código florestal, tornando aptas à compensação, pois são áreas com sua vegetação nativa preservada, sendo assim um importante instrumento para regularização ambiental.

Revista Canavieiros: Fábio, por favor descreva o que é uma floresta num estágio avançado que vocês viram lá?

Soldera: Lá se trata de uma floresta ombrófila densa, pertencente ao Bioma da Mata Atlântica. A fisionomia arbórea caracteriza-se por um dossel com cerca de 50 metros e bastante fechado, as copas das árvores são amplas e há epífitas (espécies que vivem sobre as árvores) em abundância. Identificamos a presença de bastante trepadeiras lenhosas, baixo número de espécies pioneiras e o predomínio de secundárias e tardias. Outro ponto que chamou a atenção foi a riqueza quanto a diversidade biológica, tanto da flora como da fauna (através de relatos de moradores locais e alguns avistamentos).

Revista Canavieiros: É um ambiente que não encontramos aqui na nossa região?

Soldera: Dificilmente encontramos um fragmento de Mata Atlântica nesse estágio de preservação em nossa região, até porque precisamos entender que assim como nosso potencial é agrícola, lá o foco é a preservação, pois se trata de um refúgio no estado com muitas espécies consideradas em extinção. Então, a viabilização da manutenção daquela floresta de maneira privada, como a compensação da reserva legal e a comercialização de carbono, mostra mais uma vez como o agronegócio é fundamental no equilíbrio entre o desenvolvimento econômico e a preservação do meio ambiente.

Revista Canavieiros: Sob o ponto de vista ambiental, quais as diferenças entre essas florestas em estágio avançado e as matas fragmentadas preservadas dentro das propriedades rurais?

Schmidlin: A primeira questão da floresta de grande extensão é quanto ao fluxo de animais, extremamente importante para os de grande porte que necessitam de uma extensão maior para desenvolver sua vida de maneira ideal. Outro ponto é quanto ao risco do fogo, pois estando próximas de ambientes de produção agropecuária e até mesmo de áreas urbanas, as chances de incêndios nas estações mais secas são muito maiores que em ambientes com a proteção diferenciada, por estarem perto de reservas públicas, além da dificuldade de acesso.

Soldera: Acredito que é importante contextualizar que tanto os remanescentes de vegetação localizados nas regiões de produção agropecuária do interior do estado, quanto os maciços florestais das regiões costeiras são de grande importância ambiental. Cito como uma das virtudes, os fragmentos de vegetação marginais a cursos d’águas (APP’s – Áreas de Preservação Permanente) que possuem um papel excepcional quanto a proteção dos recursos hídricos, evitando processos erosivos, mantendo a qualidade das águas dos rios e lagos das propriedades, além de servir de corredores para fauna.

Schmidlin: O Fábio foi perfeito na sua explicação, é importante deixar claro que todas as formas de preservação são de fundamental importância para o meio ambiente.

Revista Canavieiros: Vocês acreditam que o tamanho do agro paulista é capaz de absorver as duas modalidades de preservação?

Soldera: Sem dúvidas, desde o início da minha carreira sou testemunha do desejo dos produtores associados da Canaoeste em fazer concretizar o que está estabelecido no código florestal, seja através do investimento no restabelecimento de uma área própria ou através da compensação, o fato é que o agro paulista nunca teve outra posição senão a de se enquadrar no que a legislação diz.

Schmidlin: Sobre esse aspecto volto a falar da importância da compensação para o desenvolvimento social e econômico das regiões onde estão as matas preserva- das, tenho certeza que a produção agrícola é fundamental não somente para manter a floresta de pé, mas para melhorar as condições de vida de quem não só vive, mas protege ela.                

Deixe seu comentário