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Abrem-se as cortinas e começa o espetáculo

RB855156 cultivada por João Nilson Magro, uma verdadeira onda de cana em foto feita em fevereiro, e com o agrônomo da Canaoeste, André Volpe servindo de referência

16/04/2020 08:47

A safra 20/21 vai começar, talvez a mais desafiadora de todas nesses anos de crise, isso pelo fato das ilusões perdidas que o coronavirus e Arábia Saudita lhe acometeram.

Fazendo um recorte desse início de trabalho para as variedades de cana, uma das principais personagens é a RB855156, cultivar que se destaca por sua hiperprecocidade, ou seja, atualmente é o prato principal para saciar a fome das moendas após sua hibernação pós-entressafra.

A Ridesa, sua criadora, a identifica morfologicamente da seguinte maneira: “palmito de tamanho regular e capitel (parte superior) fechado. As folhas são de largura média, longas e arqueadas no terço superior e de cor verde-opaca. A bainha é de coloração verde, com borda estreita e de cor marrom, dewlap (primeira folha da haste) escuro e presença abundante de joçal que, no entanto, não é agressivo. Possui aurícula (fechamento das folhas no colmo) em forma de lança, cor de palha, comprida e bem evidente.

Os colmos têm crescimento ereto, mas são decumbentes (deitados) na fase adulta. O diâmetro é médio, com internódios dispostos em leve ziguezague, cilíndricos, de tamanho médio, coloração verde-clara, com rachaduras e pouca cera. O anel de crescimento é de cor creme e pouco saliente. A gema é romboide (forma de losango) e arredondada, de tamanho médio, sem almofada e sem canaleta. A parte superior da gema não atinge o anel superior de crescimento”.

Com um verde mais escuro, ganho de altura e bastante fechamento do talhão, a 5156 (da direita) impressiona quando chega próximo do início da safra
Com um verde mais escuro, ganho de altura e bastante fechamento do talhão, a 5156 (da direita) impressiona quando chega próximo do início da safra

Seus aspectos agroindustriais são identificados pelo programa de melhoramento genético como de ótimo perfilhamento, principalmente em soqueira, e fácil despalha, fatores que levam à conclusão de condições para alta longevidade.

Quando o plantio é manual, apresenta germinação irregular em algumas situações, fato que leva a recomendar a sua adoção apenas em condições favoráveis de preparo de solo, umidade e temperatura. Contudo, quando o plantio é feito de forma mecanizada, a cultivar apresenta um dos melhores desempenhos.

Tem alta propensão ao florescimento e é muito resistente às principais doenças que atingem os canaviais como, por exemplo, carvão, escaldadura, estrias vermelhas, ferrugem marrom e mosaico, tendo como porém uma reação classificada como intermediária – a ferrugem alaranjada. Entretanto, a doença não evolui para níveis significativos.

Ao levar essa descrição para o campo, a primeira conclusão que se chega é de que ao mesmo tempo que agrada uma quantidade interessante de produtores, abrangendo desde os experientes aos jovens, grandes ou com menos de 50 hectares, em algumas regiões o seu descarte é imediato na hora de ser fazer o planejamento varietal.

Motivos para isso não faltam, sendo os dois principais a necessidade de bastante atenção no plantio e as dificuldades para a colhedora seguir a linha em decorrência do seu tombamento e entrelaçamento.

Contudo, ela é uma cultivar com muitos fãs. Dentre eles figura um dos mais respeitados produtores de cana da região de Sertãozinho e quiçá de todo setor – João Nilson Magro. Ele já cultiva 50 alqueires da variedade e quer deixá-la somente para atender o seu plantel de início de safra.

Diante a sua experiência de cinco cortes, as principais recomendações são a respeito do plantio, que não pode ser feito muito próximo da seca (ele planta no começo de fevereiro), e cobrir os colmos com muita terra, cuja recomendação são, no máximo, cinco centímetros.

O cuidado exigido para a brotação de perfilhos (quatro, em média) no plantio não é encontrado na soqueira, onde Magro diz subir para além do dobro.

Outro destaque é que, embora não seja muito amistosa à entrada da máquina por deitar bastante, sua soqueira aguenta o “desaforo” do sistema bruto de colheita.

Além disso, Magro destaca a resistência a doenças, adicionado ao fato de ser uma cana que sombreia rápido, não dando muito tempo para o desenvolvimento das plantas daninhas.

Quanto à sua produtividade, ele diz que a cultiva tanto em solos fracos como em terra boa, e que no primeiro ambiente registrou uma produção de 92 toneladas por hectare em cana planta, enquanto que no segundo entregou 120 toneladas por hectare, nada de espetacular.

O produtor de Sertãozinho, Gabriel Merlo Galdeano, ao lado do agrônomo da Canaoeste, André Volpe. A nova geração também adota a 5156

A nova geração de agricultores também trabalha com a já tradicional 5156, como é o caso do também produtor de Sertãozinho, Gabriel Merlo Galdeano, que toca a roça ao lado do pai.

Eles têm a cultivar em quarto corte e a entregam entre os meses de maio e junho. Segundo o agricultor, entregar a variedade um pouco mais tarde exige atenção em anos mais propícios ao florescimento.

Quanto à produtividade, ele chama a atenção por ser uniforme ao longo das safras. Contudo, lembra que em regiões suscetíveis a eventos climáticos imprevisíveis, ventanias e chuva de granizo, ela pode acamar precocemente, prejudicando a colheita e também a sua produtividade.

Uma situação em que foi utilizada de maneira totalmente diferente do trivial foi no sítio de Ataíde Donizete Ferreira de Freitas, de Serra Azul. Plantada no final de outubro (2018), ela foi enviada para a usina com cerca de dez meses (corte realizado no dia 10 de setembro de 2019) e produziu 72 toneladas por hectare.

O restante do plantio de 2018 foi retirado para muda com onze meses e previsão de colheita no mês de outubro de 2020, ou seja, no período final da safra e de ano, duas características não recomendadas para a variedade.

A que foi enviada para a usina antes de completar um ano irá para o segundo corte na segunda quinzena de maio, também com uma rotina de corte inferior aos 12 meses.

Diante de tudo isso, sua aparência indica que entregará uma produtividade satisfatória segundo a expectativa de Freitas, que há oito anos comanda uma produção pequena, de 13 alqueires, sempre dirigida através da rentabilidade. É válido dizer que todos os seus manejos são terceirizados, mas Freitas, que tem a cana como segundo negócio (também comanda uma madeireira), acompanha todos os serviços de perto.

Um último detalhe vai além de todos os cuidados de plantio, iguais aos mencionados anteriormente por Magro. No plantio há um procedimento curioso: nunca executar o procedimento em lua minguante e, superstição à parte, a brotação foi boa.

Depois de conversar com outros produtores e agrônomos, a percepção que se tem é que embora tenha algumas alternativas mais tecnológicas, principalmente no aspecto de colheitabilidade, essas cultivares ainda deixam a desejar em outros atributos importantes como a resistência a doença e também de soqueira, fazendo com que se deslumbre muitos anos de reinado, para a 5156, como a principal cultivar, pelo menos para quem colhe até a primeira quinzena de abril.

O produtor de Serra Azul, Ataíde Donizete Ferreira de Freitas, ao lado do agrônomo da Canaoeste, Danilo Mazoni. O pequeno produtor não abre mão da cultivar
O produtor de Serra Azul, Ataíde Donizete Ferreira de Freitas, ao lado do agrônomo da Canaoeste, Danilo Mazoni. O pequeno produtor não abre mão da cultivar

Fonte: Revista Canavieiros – Escrito por Marino Guerra

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